Quando o assunto é Inteligência Artificial (IA) no contexto da medicina, mais precisamente na radiologia, muito se indaga sobre a possível substituição dos médicos radiologistas por softwares. No entanto, o mais provável é que a tecnologia seja utilizada a favor dos médicos, como se observa nos mais variados cenários. A intenção no desenvolvimento de soluções de IA é a colaboração com o trabalho dos radiologistas, melhorando a precisão diagnóstica e a eficiência.
É inerente ao ser humano criar resoluções para suas demandas, moldadas pela evolução e pela necessidade de sobrevivência, e, conforme as ideias de Platão em sua obra “A República”, “a necessidade é a mãe da invenção”.
Tendo em vista tal necessidade, a radiologia mamária é uma das áreas que mais se beneficiam dessas inovações, pois o câncer de mama foi responsável por aproximadamente 2,3 milhões de novos casos globalmente e causou cerca de 670.000 mortes em 2022. Isso fez do câncer de mama o mais comum entre as mulheres e a principal causa de morte por câncer em muitos países, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os exames de imagem mamária, principalmente a mamografia, ultrassonografia e ressonância magnética, desempenham um papel crucial na detecção precoce do câncer de mama.
Felizmente, padrões de imagem específicos evidenciados nesses métodos podem ser utilizados no desenvolvimento de softwares de IA, que incluem características detectáveis por algoritmos para identificar e classificar lesões suspeitas. Estamos com a “faca e o queijo na mão”, pois esses padrões observados em lesões mamárias são a base para o desenvolvimento de soluções de IA, até mesmo em lesões muito sutis, que podem passar despercebidas ao olho humano, principalmente em condições de sobrecarga de trabalho ou em olhos menos experientes.
As soluções de IA não somente podem ajudar o radiologista mamário a não perder lesões suspeitas, como também podem facilitar a gestão de serviços médicos, selecionando casos mais urgentes para que sejam analisados antes de casos que possivelmente estão dentro dos limites da normalidade. Parece algo unicamente burocrático à primeira vista, porém pode salvar vidas, sabendo que as chances de cura aumentam quanto mais rápido for o diagnóstico.
Outro importante ponto de vista a ser levado em conta nos exames de imagem, especialmente nos exames de mama, é a variabilidade na interpretação das lesões, onde um mesmo nódulo, por exemplo, pode ser categorizado como BI-RADS 3 ou BI-RADS 4, dependendo do médico que está interpretando o exame. Essa variação ocorre por diversos motivos, como a experiência do médico examinador, se é ou não especialista em imagem mamária, ajustes dos parâmetros da máquina, ou até mesmo o cansaço e as condições emocionais do profissional no momento da realização e interpretação do exame. A IA pode fornecer uma segunda opinião objetiva e padronizada, ajudando a reduzir essa variabilidade.
Como “nem tudo são flores”, há também desafios na implementação de soluções de IA na radiologia mamária, desde a segurança ao lidar com os dados dos pacientes, até questões jurídicas envolvendo erros diagnósticos. Portanto, é crucial garantir que a IA seja usada de maneira ética, sem substituir completamente o julgamento humano, mas sim complementando-o.
Concluo este texto, após discorrer sobre um tema tão importante, reafirmando a opinião pessoal de que, por mais que a inteligência artificial avance, e isso irá acontecer dia após dia, jamais substituirá os médicos radiologistas, cuja empatia, intuição, comunicação verbal e não verbal e compreensão humana são insubstituíveis e incomparáveis no cuidado ao paciente, ainda mais quando estão envolvidas questões tão delicadas como o câncer de mama. Recorro à afirmação atribuída a Hipócrates, o pai da medicina: “É mais importante conhecer a pessoa que tem a doença do que a doença que a pessoa tem”. E isso, somente um humano pode fazer.
Referências Bibliográficas
- Platão. A República. Tradução de João da Silva. 3. ed. São Paulo: Editora XYZ, 2019.
- WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Global cancer statistics 2022. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/cancer.
- Hipócrates. Tradução de Maria da Silva. São Paulo: Editora ABC, 2015.