A distrofia miotônica é uma doença hereditária de caráter autossômico dominante, com expressividade clínica multissetorial muito variável, caracterizada por afecções degenerativas de progressão lenta. Os sintomas e sinais podem se manifestar em qualquer momento da vida, desde o nascimento até a velhice, tanto em homens quanto em mulheres.
A distrofia miotônica tipo 1 é a distrofia muscular mais frequente em adultos. Pode afetar vários sistemas, como o muscular, respiratório, cardíaco, endócrino, ocular e o sistema nervoso central. Suas manifestações características incluem uma perda progressiva de força muscular, mais distal que proximal, caracterizada pela diminuição da massa muscular, principalmente na face e nos membros superiores, ptose palpebral, fraqueza dos músculos faciais, da mandíbula e da parte anterior do pescoço, miotonia, sonolência diurna, cansaço e catarata.
O primeiro a descrever o quadro clínico e os achados patológicos dessa doença foi o neurologista alemão Gustav Wilhelm Steinert (1875-1911) – por isso também é conhecida como doença de Steinert.
Um possível caso de distrofia miotônica de Steinert pode ter sido documentado pelo pintor espanhol do período barroco Juan Bautista Maíno (1581-1649) em seu “Retrato de cavaleiro” (Figura 1), que pertence ao Museu do Prado. A obra retrata a imagem de um homem de meia-idade, de identidade desconhecida, mas que certamente foi um cavaleiro de nobreza. O personagem apresenta uma evidente ptose palpebral bilateral, que lhe confere uma expressão de cansaço. Na pintura, também se destaca a calvície frontal, um sinal presente em 80% dos casos masculinos, além de uma atrofia do músculo temporal e, em menor grau, do masseter.
Como consequência da fraqueza muscular, o rosto apresenta uma aparência característica: é longo, estreito, com a pele brilhante, fina e clara, com redução de rugas e pregas no rosto do indivíduo.
Em 1564, Pieter Brueghel, o Velho (1525-1569), considerado o pintor holandês mais importante do século XVI, realizou o quadro “A Adoração dos Reis Magos”, hoje exibido na National Gallery de Londres (Figura 2 mostra um detalhe do quadro). O pintor flamengo imaginou uma visita dos Reis Magos atípica, grotesca e irônica, totalmente distante da imagem tradicional do Renascimento italiano, brilhante e majestosa.
No ambiente popular característico das obras de Brueghel, destaca-se a presença de uma comitiva excêntrica, da qual apenas José, a Virgem e o Menino são poupados. Observando os detalhes, chama a atenção a imagem do rei mago que apresenta a Jesus a oferta de incenso, evidenciando uma alteração facial bilateral compatível com atrofia muscular, além de outros sinais típicos, como rosto alongado, ptose parcial bilateral e calvície frontal prematura.
Prof. Dr. Alfredo E. Buzzi
Profesor Titular de Diagnóstico por Imágenes, Universidad de Buenos Aires
Miembro Honorario Internacional de la Sociedad Paulista de Radiología
El autor es editor de la Revista “ALMA- Cultura y medicina”