JPR 2024
Fotos: Gabriela Gonçalves

IA em projetos de pesquisa

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Na segunda parte do módulo de Educação e Introdução à Pesquisa, dedicada à introdução à pesquisa e realizada no dia 2, Dr. Eduardo Mortani Barbosa Jr.  falou sobre os projetos de pesquisa em radiologia usando a inteligência artificial (IA). Na aula, o professor fez questão de demonstrar que na realidade IA não é uma black box.  “Trata-se de modelos matemáticos que podem ser preditivos ou inferenciais ou lineares ou não lineares, com variáveis independentes ou dependentes”, afirmou.

Os principais modelos demonstrados pelo Dr. Eduardo foram os de regressão, a árvore de decisões e as redes neurais. “Nenhum modelo domina, por isso é importante saber como funcionam todos os modelos. IA é um nome guarda-chuva onde podemos abrigar modelos que convêm melhor a um ou outro objetivo de pesquisa. Por exemplo, os modelos de árvore de decisões são bons para guidelines, pois são bem intuitivos para médicos”, declarou.

Dr. Eduardo Mortani Barbosa Jr.

De acordo com o radiologista da Pennsilvania University, o que normalmente é feito é um tradeoff, em que a decisão de uso do modelo é entre modelos mais fáceis de interpretar e menos acurados, ou mais acurados, mas de interpretação mais difícil.

A rapidez dos computadores hoje determina basicamente o que é possível fazer usando esses modelos. Desde 2012, quando surgiu a primeira inteligência que fazia classificação de imagem (AlexNet), a evolução da velocidade dos computadores saltou de forma exponencial.

“Mas não adianta ter boas ideias e dados de qualidade e não ter o gerenciamento do projeto. Por isso usamos os 4Ps: planejamento, pessoas, processo – como otimizar com o que você tem em mãos – e poder – estabelecer hierarquia, coordenação e comunicação e correção de curso”, explicou Dr. Eduardo.

A metodologia usada pelo médico é definir quem está liderando, quem está financiando, quem é seu time e assim são seus projetos de pesquisa IA em cardiotorácica.

Uma das pesquisas foi usada para estabelecer quais pacientes teriam chance de desenvolver BOS (síndrome da bronquiolite obliterante), uma doença que afeta transplantados de pulmão. O método compara o uso da tomografia e prova de função pulmonar para determinar os pacientes com prognóstico ruim, pois o transplante pulmonar é caro e costuma ter uma taxa de sobrevida curta.

Em uma segunda pesquisa, usaram dados a partir de tomografias e raio-x de pacientes com covid-19 e criaram uma rede neural. Na comparação, o modelo foi equivalente à expertise dos especialistas laudando os exames.

Em outra pesquisa, também usando o tema covid-19, desta vez um estudo multicêntrico, usaram ferramenta de machine learning para identificar, pela idade, pacientes com potencial para desenvolver covid-19 severo e doença pulmonar grave. “Tendo tantas informações para analisar, nosso resultado mostrou que a IA foi melhor que os seres humanos”, afirma.

Segundo o Dr. Eduardo, a IA e machine learning são ferramentas poderosas não só para entender o que acontece, mas o que vai acontecer depois, ou seja, ferramentas de predição. Mas só funcionam respondendo questões relevantes e para estabelecer as questões é preciso a expertise humana.

 

“ChatGPT inventa algumas coisas”

Dr. Jorge Elias Jr.

O moderador do módulo, Prof. Jorge Elias Junior, da FMRP-USP, falou sobre o caminho da pesquisa à aplicação clínica com dicas pontuais. “Cuidado com ChatGPT, especialmente em revisão de artigos, porque ele inventa algumas coisas”, brincou o médico.

Dr. Jorge se considera um earlier adopter da IA e acredita que foi um movimento natural, pois a radiologia foi para o digital.  “Mas para mim, a utilidade clínica ainda é o valor central”, afirma.

O professor mostrou como as pesquisas são realizadas na FMRP usando a IA na área de abdome, como estudos de mensuração da gordura abdominal usando a tomografia. “A aplicação da inteligência artificial na medicina é inexorável, mas é fundamental que haja transparência na pesquisa em IA. O que é disponibilizado nos artigos não tem essa transparência, porque tem que ser apresentado no método algo possível de ser replicado e hoje, a maioria dos estudos não apresenta essa replicabilidade. Entre outras questões, há sigilo comercial no meio”, revela Dr. Jorge.

A IA pode ser método, objeto, ferramenta ou inovação da pesquisa. A radiologia é um ambiente favorável para seu desenvolvimento e deve-se discutir a responsabilidade médica/jurídica, aumento relativo da carga de trabalho, pressão para transformação, entre outras questões.

“O desafio é lembrar que temos que cuidar de gente”, concluiu o Professor Jorge.

 

IA gera oportunidades, mas também um tsunami de informações

O tema do Dr. Luciano Prevedelo, da Ohio State University Wexner Medical Center, onde o médico se divide entre laudar exames e dirigir a área de informática médica, foi o uso da IA em neurorradiologia. O professor começou sua aula mostrando como em 2016 a Imagenet Competition determinou que a capacidade de deep learning era superior à capacidade humana em reconhecer imagens. “Isso causou um furor na época, disseram que os radiologistas estariam extintos em cinco anos. Hoje vemos que a inteligência artificial não é tão inteligente assim…”, declarou.

Quanto ao uso do ChatGPT na medicina o médico lembrou que “tudo tem o lado bom e o lado ruim”.

Dr. Luciano Prevedello

Uma das pesquisas de sua equipe detectou que o deep learning poderia distinguir os casos que precisariam ser laudados de forma emergencial criando uma lista focada na priorização do paciente internado. Em outro estudo, usam a IA para a detecção de metástases muito pequenas no cérebro. “Os dados da literatura dizem que os especialistas ‘deixam passar’ as menores e a IA mostra onde estão os principais pontos, para facilitar a visibilidade de lesões pequenas”, informa o Dr. Luciano.

“A IA gera uma série de oportunidades que não existiam antigamente e gera um tsunami de informações e não sabemos o que fazer com isso. Inclusive traz informações que não constam na literatura e a literatura não diz se eu preciso usar o dado no laudo ou não”, afirma o médico. Na prática clínica, os métodos de inteligência artificial extraem informações, encontra discrepâncias nos achados, destaca tempos entre a comunicação. Na pesquisa, a principal ajuda é na extração de dados. “É quase como um tumor board, onde você pode consultar informações com os colegas”, diz.

Na conclusão da sessão foi levantado o ponto de que a maior discordância é na questão do que é inteligência em si. Para o Dr. Eduardo, os algoritmos respondem sistemas a que foram treinados. “O sistema responde sim ou não, mas não tem o discernimento humano para dizer que está em uma área de incerteza”, revela. E para o médico o setor da saúde é mais conservador e ele não acredita na experimentação aleatória, além da necessidade de integração dos sistemas, de forma a facilitar o trabalho do radiologista.

Sobre o uso comercial e prático das ferramentas criadas no Serviço do Dr. Luciano, ele vê como muito práticos e vê a possibilidade de virarem produtos e serem incorporados aos PACS, por exemplo, mas não é o foco dele, já que atua em um hospital público. “Criei um sistema de detecção de metástase e posso usar, mas não posso vendê-lo sem a aprovação do FDA, por exemplo”, afirmou.

A aplicação da IA tem que ter “muito foco no paciente”, de acordo com o Dr. Jorge Elias. “Não somos Google, Amazon, Facebook. E os órgãos regulamentadores têm a função até de não deixar que essa revolução aconteça de forma muito rápida e não pensada, mas vai chegar um momento em que a tecnologia vai se impor”, reflete.